Do logos ao mito

 


UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

 

MAURICIO MAXIMINO

 

 

A RAZÃO DO DISCURSO DA SUPERAÇÃO E/OU OPOSIÇÃO DO LOGOS AOS MITOS

 

  

 

Trabalho Final, como requisito para obtenção de aprovação.

 

 

   

NITERÓI

2013-2019

 

 

 


“Em geral, o que se escreve deve ser fácil de ler e de pronunciar, o que é o mesmo. Não se obtém isso em frases com muitas conjunções, nem nas que são difíceis de pontuar, tais como as de Heráclito.

É uma dificuldade pontuar as frases de Heráclito porque não é claro a que termo uma palavra se refere, se ao que a precede ou se ao que a segue. “

Aristóteles, Retórica. 1.407b 11-15.

 

 

RESUMO

 

 

O presente trabalho resulta das discussões e apontamentos em sala de aula durante o curso de Filosofia no qual abordamos o histórico, transformações, pertinência e comprometimento do homem com as ciências, na busca de seus questionamentos sobre o que há e o que é, em sua existência.

No intuito de fomentar tal discussão, propomos repensar a relação entre mitos e logos, num momento histórico onde residem os fundamentos do que hoje conhecemos como ciência.

 

Palavras chaves: Filosofia, História, Mitologia, Discurso, Ciência.

 

ABSTRACT

This work is the result of discussions and notes in class during the course of Epistemology in which we approach the historic, transformations, relevance and commitment of sciences to the men, in search of their questions about what there and what is in existence .

In order to foster such discussion, we propose to rethink the relationship between myth and logos, at a historical moment in which they live the fundamentals of what we know as science.

 

Key words: Philosophy, History, Mythology, Speech, Science.
 

I

 

Quando analisamos a história da Filosofia, podemos identificar diversas modalidades discursivas na atividade filosófica; especialmente formas de organizar a linguagem que, de tempos em tempos, eram substituídas, se modificavam ou chegavam até a contemporaneidade com novas características. Apesar das origens espaciais serem igualmente diversas, esses documentos guardavam em suas formas um modo de escrita em comum e essas “familiaridades” permitiram a criação de nomenclaturas, classificações, fundando o que hoje chamamos de gênero textual.

Ainda em nossa análise, percebemos que o gênero textual está ligado ao momento histórico da sociedade em que o autor está inserido e que esta é influência fundamental para a forma do filósofo se manifestar, pois ela mesma foi quem o conduziu (pedagogia) a um específico escrever e pensar filosófico.

Na Grécia antiga identificamos a primeira ruptura: Onde havia o uso majoritário da poesia por razões de estilo e técnica, especialmente à memorização, passamos a ter diálogos, em forma de texto, que se assemelhavam às discussões na Ágora. Procuramos, neste trabalho, questionar a existência da ruptura também do discurso, da chamada gênese da (busca pela) razão em detrimento da explicação dos mitos.

II

 A origem do cosmo segundo os mitos traz, em forma de símbolos, a satisfação pela “explicação” do que há. Neste contexto, o que deve ser contado precisa não apenas dar conta do tangível, mas também das “leis” que regem as relações entre os homens, tais como os desejos, paixões, moral, etc. Esse caráter holístico é apresentado de forma poética, na Grécia antiga, para fácil assimilação e reprodução.

A importância de tais registros ou obras são tão grandes que estas formam a base da educação grega (Παιδεία). É uma linguagem polissêmica, que não tem compromisso com a demonstração da experiência através do λόγος (explicação natural) ou segundo qualquer critério que não a inspiração divina, seguida da revelação pelos oráculos sobre o que se pergunta.

Contudo, nos séculos VI e V a.C, uma nova realidade se constrói nas cidades de fala grega, um modo de se relacionar com o outro totalmente sem precedentes. Novas regiões e seus núcleos surgiam decorrentes do aumento do comércio e, por conseguinte, oligarquias locais também cresciam. A filia dos gregos pela discussão foi uma das características que transformaram a sociedade, outrora pensada conforme os mitos Homéricos, em um arranjo no qual cabia aos homens o dever e o direito de conduzir os negócios públicos através de uma forma de discursar.

Com este quadro podemos compreender o surgimento de uma nova significação para o logos e o aparecimento de uma nova ordem de pensar as coisas. A linguagem filosófica vem para saciar uma sociedade que não encontra mais nos mitos respostas aceitáveis para os seus questionamentos.

A filosofia procura “desmistificar” os símbolos presentes na poesia, questionando a razão daquilo de que se fala. Ao perguntar “o que é” uma coisa, o discurso já “limita” o tipo de resposta; que somente poderá ter um caráter filosófico. Assim, essas novas palavras semeiam uma nova linguagem e, por conseguinte, um novo discurso sobre o que há.

Apesar de mostrar-se tão distinta da poesia mítica, a filosofia, em seu início, se nutria, dos temas e estruturas poéticas. A contribuição poética para a filosofia estava na busca das mesmas “leis” (ἀρχή) que os poemas explicam as coisas, contudo suas respostas estavam firmadas numa outra perspectiva.

O mesmo homem que agora se espanta (θαυμα), outrora gloriava os deuses pelo que há. Ao deixar os mitos, o homem passa registrar, posteriormente em grandes tratados, o que seus predecessores chamavam de physis, como se  pudessem dar conta de “transcrever” todas as ‘coisas’ da natureza.

Thomas Kuhn, em A Estrutura das Revoluções Científicas, diz que a mudança de um paradigma para outro não ocorre porque um paradigma é melhor do que o anterior, mas sim porque as questões que permanecem já não são mais respondidas pela forma vigente de pensar. Ou seja, um acontecimento na história muda a compreensão da sociedade sobre algo e assim uma crise surge na filosofia e nas ciências. Ainda segundo Kuhn, a ciência se desenvolve conforme as fases a seguir: Estabelecimento de um paradigma. Ciência normal. Crise. Ciência Extraordinária. Revolução científica. Estabelecimento de um novo paradigma.

Por esta razão, entendemos que apesar de não se tratar de ciência, o caso na Grécia Antiga é facilmente absorvido pela teoria de Kuhn quando acrescentamos uma análise histórica, sendo assim, é coerente dizer que o que muda naquela “revolução” é a hegemonia do discurso e não um discurso sobre o outro. Os mitos permanecem, porém nomeados de forma diferente, adaptados à nova forma de crença vigente, que será conhecida como ciência.

III

 No período histórico posterior ao tratado acima, Era Medieval, escritos semelhantes a uma legislação, que talvez resgatem Moisés e os Dez Mandamentos, se apropriaram da Metafísica Aristotélica para fundamentar doutrinas cristãs na forma de leis da razão. Algo facilmente e fortemente criticado, pois justificou por décadas a imposição de dogmas da Igreja travestidos de discurso racional. Já na virada do século XIX para o XX, os aforismos de Nietzsche, textos curtos de máximas polissêmicas, marcaram um período onde a dedicação à busca da “verdade filosófica” alethea já não encontra razões para sua manutenção; vide a força do ceticismo e relativismo em ascensão neste momento, além disso, há uma nova relação do homem com o tempo devido os avanços tecnológicos que se seguiram e que “aceleraram” a sociedade.

Todos esses momentos são passíveis da interpretação e de identificação dos sintomas históricos e sociais que pavimentaram a hegemonia de um discurso em detrimento do outro. O que então, na Grécia antiga, pode ter manipulado e alicerçado a razão como o “modo natural” do homem de se perguntar e obter suas respostas? E o mais importante, para qual finalidade? Haveria algo exterior aos homens que os fizeram abandonar os mitos espontaneamente, ou foi conveniente que fizessem tal ruptura?

Concluímos sem respostas às questões que nos motivaram a este trabalho, porém passamos a compreender que a Filosofia excede os próprios Filósofos e que além disso, estes não tem domínio pleno de suas posições em filosofia. Pois, o que lhes impulsionam é metalinguístico e a apropriação do seu próprio texto pode não se dar no período de sua escrita, mas sim quando esta for mais conveniente a um dado momento histórico.  




































ARISTÓTELES. A Política. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
KUHN, Thomas. A estrutura das revoluções científicas. SP: Perspectiva. 1987
COSTA, Alexandre. Heráclito Fragmentos Contextualizados. RJ. Odisseus. 2012
Silva, Mário Júnior. Literatura Antiga. Acesso em 10/12/2013. http://pt.slideshare.net/mariojunior1000/teoria-da-literatura-4673936

 

 

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