O pecado de Maximino

No livro do Gênesis, temos a chamada primeira criação: um Deus que cria o mundo de forma histórico-processual, através da palavra. A criação das coisas parece seguir uma ordem, um arranjo de interdependência entre as coisas que vêm sendo criadas. A imagem é de um mundo que, uma vez posto em funcionamento, será capaz de, por si mesmo, garantir a sua manutenção.

A Criação começa com a presença de duas instâncias, fundamentais a todas as coisas: o Tempo.

“No princípio, Deus criou o céu e a terra.” (Genesis 1. 1) e “Deus chamou à luz ‘dia’ e às trevas ‘noite’” (Genesis 1.5).

E o Espaço; quando há a separação do vêm sendo criado: firmamento, divisão das águas, terra seca e os mares.

Ao final desse trecho é feita a primeira adjetivação sobre o que fora criado. "(...) e viu Deus que era bom." (Gênesis 1:10). Este predicado sugere a marcação de uma tarefa concluída, considerando a perspectiva histórico-processual da Criação.

Estabelecidas as instâncias: Tempo e Espaço, é então possível a criação daquilo que vai "povoar" esses fundamentos e, ao mesmo tempo, estar sujeito a eles.
A partir disso, a voz do Criador não opera mais ex-nihilo, mas ordena ao existente que isso produza novas coisas. Então, dessa forma indireta, é criado um ambiente autossuficiente (Gênesis 1.11-12), destinado a suportar e suprir o que viria a existir: os animais e, por fim, o homem. Mais uma vez, ao final dessas coisas, outra "marca de conclusão".

Em seguida, são criados dois luminares "para sinais e para tempos determinados e para dias e anos." (Gênesis 1:14), o que indica que os animais e o homem terão capacidades perceptívas, comportamentos sazonais, instintos e, no caso do homem, o conhecimento; conforme a influencia dos luzeiros.

Também de forma indireta, o Criador ordena as águas a produzirem animais, bem como a terra a produzir outras espécies. Ambas ações são sucedidas pelo adjetivo: "bom".

Por fim, o homem e a mulher são criados diretamente pelo Criador, à imagem e semelhança dele. Assim como a terra e as águas, os humanos recebem uma ordem. Neste caso, dominar e sujeitar o que fora criado; o que retrata a característica do Criador (imagem e semelhança), de "ordenar" e fazer crescer (multiplicar) os animais e as plantas.


O segundo texto sobre a criação tem um caráter antropólogico/antropocêntrico. Lemos, a partir do versículo 5, que, a ausência da chuva e da participação do "homem lavrador" (sexo masculino) são determinantes para o “funcionamento” da natureza (mobilidade - mover o imóvel). Esses dois elementos fundamentais são criados/sustentados, respectivamente, pelo vapor "Um vapor, porém, subia da terra, e regava toda a face da terra." (Gênesis 2:6) e pelo sopro divino "E formou o Senhor Deus o homem do pó da terra, e soprou em seus narizes o fôlego da vida; e o homem foi feito alma vivente." (Gênesis 2:7).

Diferente da "primeira Criação", que trata do mundo todo, o texto segue para um recorte geográfico - sobre o qual, mesmo com o nível de detalhamnto (e talvez por conta disto) não fomos capazes de fazer inferências.
O Criador planta um jardim e põe o homem lá para cultivar e guardar. Mostrando o a função/responsabilidade do homem quanto a manutenção da criação (ecologia) e marcando uma autonomia/arbítrio do homem em realizar modificações na natureza (técnica/ciência). Os animais ainda viriam a ser criados e, sobre eles, o homem dominaria.
Neste momento, fica claro que o jardim é diferente do mundo outrora criado. O que nos leva a pensar que se trata de algo que está além da natureza, porém pertencente a ela, porque é algo exclusivo ao homem. O Criador é quem planta as árvores cujas caracteríticas (frutos/sabor) são a beleza (entretenimento/prazer), alimento (necessário), vida (espírito/sopro) e conhecimento (arbítrio/discernimento).
 
Tamanha capacidade/poder dado ao homem veio porém com uma interdição: Não comer da árvore do conhecimento do bem e do mal, sob a certeza da morte.

- O homem tem sua satisfação plena* naquilo que o Criador deu e no "fruto" do seu trabalho (capacidade dada pelo Criador); ou seja, alimentar-se e ter prazer na sua existência. O conhecimento (árvore), também gera frutos, mas a ordem é não se alimentar dele. Pois o fruto conhecer dá ao homem independência de Deus, fazer escolhas não naturais e, futuramente, construir artifícios para emular a natureza criada. Em última, instância, o homem tenta evitar a morte, através do conhecimento, algo que seria natural, não temível, caso não conhecesse.

O ápice/entimema da criação se dá quando o Criador vê que o homem necessita de companhia que lhe seja semelhante, pois dentre os animais, não há algum que o corresponda (à altura). Então, o Criador toma do homem uma parte, e disto forma a mulher. Juntos, são uma só carne. O homem está completo e a natureza lhe serve.

- A exemplo de outros escritos sagrados, estes textos se propõem a olhar para os mistérios da realidade e dar uma explicação a eles; ao mesmo tempo em que, através do próprio texto, justificam a manutenção das coisas que existem. Cabe, portanto, aproveitar as polissemias e o caráter poético desse gênero textual para construir os alicerces do que for conveniente ao espaço/tempo de cada leitor.




*Após a formação da mulher.

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